Dois dos maiores problemas atuais do mundo são a falta de energia e o excesso de lixo. E a principal área de pesquisa da professora Ruihong Zhang, do Departamento de Engenharia Biológica e Agrícola da University of California, Davis, tenta resolver de uma vez só esses dois problemas juntos.
A professora e os cientistas do grupo que ela coordena estudam o uso de bactérias para transformar lixo orgânico em energia. Em busca de solução para uma questão que se resume em “como transformar o máximo possível de lixo orgânico em energia renovável”, ela já pesquisa esse tem há quase 20 anos.
Em abril deste ano a UC Davis inaugurou uma usina de biodigestão de lixo a partir da pesquisa de Zhang, assim a pesquisa deixou de ser básica para ser aplicada. A usina, chamada de Digestor Anaeróbico de Energia Renovável da UC Davis, ou simplesmente Read, na sigla em inglês, custou US$ 8,5 milhões.
Ela foi instalada no antigo depósito de lixo da universidade e usa uma tecnologia desenvolvida por Zhang e licenciada pela UC Davis para a CleanWorld, empresa formada por ex-alunos de Zhang e da universidade. No sistema, microrganismos em grandes tanques sem oxigênio consomem o lixo orgânico produzido no próprio campus e lá armazenado. Por meio da fermentação, bactérias devoram o lixo e produzem metano e gás carbônico, ou seja, biogás.
O Read foi projetado para converter 50 toneladas de lixo em 12 mil quilowatts/hora de energia por dia. Além de produzir energia renovável, a usina livra a UC Davis de 20 mil toneladas de lixo por ano. Os números são importantes, pois destacam uma vantagem na tecnologia desenvolvida por Zhang.
O uso de digestores anaeróbicos para produzir energia é conhecido, mas a diferença nesse caso está na eficiência. De acordo com a professora, o sistema utiliza variedade e quantidade muito maiores de lixo do que em modelos tradicionais.
A tecnologia, denominada HSAD (High Solids Anaerobic Digestion), é capaz de usar uma grande variedade de dejetos orgânicos, tem uma taxa de digestão rápida e elevada produção de energia. “Também destrói patógenos presentes no lixo, resultando na produção de biofertilizantes”, disse Zhang, que dirige o Centro de Pesquisa em Biogás na UC Davis. Uma usina piloto foi construída em 2004 durante sua pesquisa.
Por estar instalada em um antigo depósito de lixo, que produz naturalmente grande quantidade de metano, a usina também combina o biogás produzido por meio das bactérias com o metano do antigo lixão. O resultado é a capacidade de gerar 5,6 milhões de quilowatts/hora de energia.
Por transformar os gases em energia, a usina ainda reduz a emissão de gases causadores do efeito estufa em 13,5 mil toneladas por ano. Tanto a energia produzida como os créditos de carbono ficam na UC Davis.
A usina tem capacidade para gerar cerca de 15 milhões de litros de fertilizantes por ano, quantidade suficiente para suprir a demanda de cerca de 600 mil metros quadrados de área cultivada.
“É preciso destacar que o sistema de biodigestão não é importante apenas por produzir energia ou fertilizantes, mas também por trazer uma utilização para o lixo que produzimos. Trata-se de uma tecnologia que permite que sejamos mais sustentáveis, tanto econômica como ambientalmente”, disse Zhang, uma das palestrantes da FAPESP Week California, realizada em dois campi da University of California (Berkeley e Davis) em novembro.
Tal evento contou com apoio do Brazil Institute do Woodrow Wilson International Center for Scholars, em Washington.
Fotos: Karin Higgins/UC Davis/Reprodução