Entrevista – Preto Zezé, o presidente da CUFA!

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“Nascido e criado na Quadra Santa Cecília, filho da Dona Fatima e do Chico Macumbeiro. Lavador de carro, produtor cultural e musical, radialista, consultor, educador, rimador nas horas vagas e um curioso pelo aprendizado. Hoje, mais um executivo social da CUFA e Presidente da CUFA BRASIL”, assim se define José Pereira, conhecido nacionalmente como Preto Zezé. Um dos grandes nomes do Hip Hop do estado, milita há mais de vinte anos nos palcos e fora deles também. Foi a música que transformou a vida desse cearense. Depois do contato com o Hip Hop, Preto Zezé iniciou no ativismo social e percebeu a necessidade de integrar as mensagens das músicas ao cotidiano das pessoa.

O cearense, que ganhou ainda mais destaque após o trabalho realizado na Central Única das Favelas (CUFA), ao lado de MV Bill e Celso Athade, agora comanda a presidência da organização. Depois de 13 anos sob a presidência de cariocas, a CUFA agora passa ao comando de um cearense. Outra quebra da paradigma conquistada por Preto Zezé. Em entrevista concedida ao No Pátio,  o presidente da Central Única das Favelas fala sobre  mobilização social, realidade cearense, copa de 2014, olimpíadas de 2016, trajetória de vida e, claro, o comando da CUFA. Leia a entrevista na íntegra.

1.     Qual o significado de ter um nome cearense na presidência da CUFA nacional?

Significa que a CUFA, está sendo coerente com sua linha de corrigir desigualdades, pois estamos invertendo à lógica dentro da nossa própria instituição, não basta discursar contra a centralização do eixo RIO-SP, é preciso na prática, construir outra lógica. Um dado importante, é que a vice- presidenta é de Cuiabá, Mato Grosso, Karina Santiago, ou seja, estamos revelando, talentos formados em nossas lutas diárias, possibilitando que o Brasil conheça quadros capacitados para protagonizar mudanças substantivas nas favelas brasileiras, mais que um título institucional, vejo a minha escolha como presidente da CUFA NACIONAL, como uma conquista coletiva, que está para além do Zezé.

 

2.     Com quantos anos você se tornou um líder? Como aconteceu isso?

Iniciei no ativismo social, através da música rap, no inicio de 1992, a música transformou minha vida, com o tempo, percebi que era urgente levar esse discurso das músicas para as práticas cotidianas e agregar mais setores, inclusive, quem nem gosta de rap, para um objetivo maior. As favelas são territórios ricos e diversos em cultura e criatividade, logo, precisávamos ter o rap e os outros elementos do Hip Hop, como o grafite, o dj e o break, como janelas de acesso para outras linguagens,  para poder gerar uma mobilização, e ter uma agenda comum com outros setores das comunidades, que não dialogam com o Hip Hop, e fazer dessa cultura de rua uma forma de ampliar os horizontes de visão de mundo e servir de pontes com o mundo do asfalto.

 

3.     Como a música e o cinema podem ajudar os moradores da periferia?

A música é um dos maiores formas de inclusão das favelas, o cinema, durante muito tempo, foi algo distante basta ver os dados da quantidade de salas de cinema, e eles vão se agravar mais, quando analisamos os dados de acesso a 7ª arte. A CUFA tem um princípio;romper a lógica de ser coadjuvante da própria historia, isso significa, que muita gente já retratou as favelas , agora chegou a hora das posições se inverterem, por isso, lançamos nacionalmente, o CINE CUFA (ww.cinecufa.com.br), e mais recentemente foi lançada a CUFA FILMES, pois no primeiro momento iniciamos um dialogo com o que tem de melhor no cinema, na comunicação e na múcia como : Caca Diegues, Caetano veloso, Katia Lund, Paula Lavigne, Ivana Bentes, dentre outros. Na área da música, seguimos a mesma lógica, onde mais recentemente, foi realizado na cidade do Rio de Janeiro, o Favela Festival ( www.favelafestival.com.br), que surge para valorizar, fortalecer e ser a vitrine do que se tem produzido de melhor na musica brasileira.

 

 

4.     A mudança na economia brasileira nos últimos 10 anos tem chamado a atenção dos governantes para a força de consumo dos moradores das favelas. Você acha que esse interesse das grandes marcas é positivo ou atrapalha o desenvolvimento das ações sociais?

Sempre que  nossa comunidade se torna interessante, por algo que vai além do crime,  das tragédias e da eleição, vejo como positivo. O consumo tem sido importante, pois apesar de caminhar para o ranking das maiores economias, somos frutos de uma sociedade mal resolvida, que não superou as sequelas da escravidão,  que assassinou seus índios, e que ainda se guia por uma cultura baseada na casa grande e senzala. Numa sociedade capitalista, o consumo vem ser a forma de democratizar para grandes contingentes da população, o acesso a riqueza e as oportunidades, acumulada na mão de poucos. O fato  das marcas se interessarem pelas favelas, comprova que a cada dia cresce um movimento onde as favelas começam a ditar suas próprias regras, a desenvolver suas tecnologias, a produzir seus próprios conhecimentos, e decretar o fim dos intermediários e falar por conta própria, sua visão de mundo, seus interesses e seus sonhos.

 

5.     Na Copa 2014 e nas Olimpíadas 2016, o mundo inteiro vai voltar os olhos para o Brasil. Como a CUFA planeja aproveitar estes dois grandes momentos?

ANTES- Acompanhando e buscando sempre um diálogo com os diversos setores envolvidos, por isso estamos fazendo parte da SECOPA, a convite da Assembléia Legislativa e do Secretário Especial da Copa, Ferruccio Feitosa.

DURANTE- Iremos contribuir com o que for possível e necessário, para  que os investimentos e as ações da copa possam garantir ,cada vez mais, a inclusão das populações mais excluídas,e assim, ajudar a articular o aproveitamento pós copa.

DEPOIS– para possibilitar que a população tenha ganhos sociais, econômicos e culturais, com o que ficou desse processo, para que tanto as obras, como os investimentos não fiquem somente restrito ao evento em si.

EM RELACAO A OLIMPÍADA – Iremos nos empenhar e participar de maneira semelhante ao que estamos fazendo com a COPA 2014.

 

6. A realidade cearense é muito diferente da realidade do resto do Brasil no tocante à mobilização social dos moradores das favelas?

Nem tanto, temos debatido isso internamente na CUFA, os movimentos sociais precisam se atualizar, pois como o Brasil está sob a direção de um terceiro governo de esquerda, grandes parte das pautas foram contempladas, existe uma melhoria significativa nas várias áreas sociais e econômicas no Brasil, precisamos nos preparar para uma segunda etapa, que é aproveitar esses avanços e melhorias e ampliar as conquistas, e formando assim uma consciência mais avançada.

Lógico que ainda existe pobreza, fome, miséria e desigualdade, mas não quer dizer que estamos mortos temos que nos mover e transformar essas dificuldades em oportunidades. Outro fato importante, é que grande parte das lideranças sociais agora são governos, isso coloca um desafio na mobilização social no país: como evoluir para uma agenda mais avançada aproveitando os avanços que o pais conquistou nos últimos anos?

A realidade atual, não suporta mais uma revolução de megafone, a favela está de Playstation 3, TV LCD, comendo pizza, indo a praia, ao cinema, ao shopping, não dá para continuar chorando miséria”. Ao mesmo tempo é preciso construir autonomia de verdade, sem aparelhamento partidários, a democracia precisa viver com uma sociedade organizada e critica, ter uma postura política não quer dizer ter uma política partidária, precisamos fazer na prática ações que tragam de volta os interesses pela política, para além da venda do voto,do curral eleitoral, da troca de cargos, enfim, o Brasil precisa avançar social e politicamente como está avançando a economia, por isso, prezamos tanto por nossa autonomia e pela ação prática.

 

7. As pessoas que se interessam em ajudar os projetos da CUFA podem entrar em contato com a organização? Existem voluntários? Como fazer para se engajar?

Sim, basta acessar o nosso site, www.cufa.org.br e procurar o estado, município, cidade e bairro e conheçam as nossas ações. Estamos abertíssimos a todo tipo de ajuda, um dos nossos princípios é agregar, juntar forças, ideias, inteligências, conhecimentos, sonhos, alegrias e disposições. Nosso lema é “preparar os escolhidos e agregar os preparados”. Então sinta-se convidada a fazer parte desta família!

 

8. Para terminar, gostaríamos de saber, em uma frase, como seria a Fortaleza perfeita para você?

Um lugar menos apartado, onde o encontro entre todos fosse permitido, respeitando a diversidade e as potencialidades do nosso povo!

 

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